AOS 82 ANOS
Faleceu o maestro
Joel Canhão
Joel Ferreira Canhão faleceu ontem, aos 82 anos. Considerado por
muitos como músico, poeta e humanista exemplar, o seu funeral
realiza-se hoje, às 10h00, da Capela da Universidade de Coimbra,
onde foi organista titular, para a capela da Igreja de Barosa,
Leiria, de onde era natural. O coro que dirigiu e fundou em 1980
prestar-lhe-á a última homenagem.
Concluído o Curso Superior de Música em Piano no Conservatório
de Lisboa, Joel Canhão esteve, ao longo da vida, ligado à
docência em vários estabelecimentos de ensino e à direcção de
vários coros como o Orfeão Escalabitano, o grupo Coral Alfredo
Keil, o Orfeão Académico de Coimbra e o coro dos Antigos
Orfeonistas da Universidade de Coimbra (AOUC), do qual foi
fundador.
Foi através do grupo coral de Santarém que o médico José Miguel
Baptista, membro dos AOUC, teve o primeiro contacto com o
maestro. Decorria, pelo ano de 1965, um encontro de grupos
corais de várias faculdades. Joel Canhão “deu nas vistas” por
comandar o grupo de cerca de 20 vozes masculinas que tinha «uma
sonoridade espantosa». Rapidamente foi apontado «por
unanimidade» para suceder como regente a Manuel Raposo Marques,
que daí a pouco tempo deixaria a direcção do Orfeão de Coimbra.
Lá permaneceu durante sete anos.
José Miguel Baptista, em declarações ao Diário de Coimbra,
lembra-o como homem de uma aparência «aparentemente» dura, mas
de uma «afabilidade extrema» e uma «sensibilidade espantosa». No
seu trabalho «não fazia concessões». Do ponto de vista artístico
considera ter-se perdido «um pilar discreto mas a quem muita
gente foi beber»; «não lambia botas», «sempre respeitou os seus
superiores, nunca se vergou e nunca espezinhou quando estava por
cima», explicou. Homem que diz ter-se valido a si próprio,
«nunca foi de políticas», foi antes um religioso praticante,
especialmente nesta fase da sua vida, acrescentou.
“Músico de primeira água”
Também Virgílio Caseiro, maestro da Orquestra Clássica do Centro
que o conhecia há mais de 40 anos e se relacionava com ele desde
que veio para o Orfeão, salientou-o como «grande pela mestria
que tinha e a grande formação que sempre deu prova», o que o
colocava numa situação de respeito a nível da cidade e da
música. Caracterizando-o como «músico de primeira água»,
indicou-o ainda como um poeta (escrevia sob o pseudónimo Mouro
Serpa) com obra publicada de «muito boa qualidade» e um
«humanista exemplar».
No domínio da música, as suas publicações abrangem um leque
variado de livros sobre educação musical, canções, coros, peças
de piano e outros instrumentos. Enquanto figura do Conservatório
de Música de Coimbra, por onde também passou, Joel Canhão deixou
«obra» que o actual director, Manuel Rocha, diz ter agora a
«obrigação» de continuar. «Grande compositor, com vastíssima
obra pedagógica», era «um grande pedagogo, característica que
guardou até ao final da vida», com personalidade nobre, mas que
«passava despercebido».
Manuel Rebanda, o presidente do Coro dos Antigos Orfeonistas,
organização que contribuiu para que desenvolvessem um
«relacionamento muito estreito», realçou a «rara sensibilidade»
de um homem e de um poeta que «fez muito pela música de
Coimbra», tanto a nível dos referidos Orfeão Académico e Coro
dos Antigos Orfeonistas, mas também enquanto organista da Capela
da Universidade de Coimbra.
Em 1987 Joel Canhão foi condecorado pelo então Presidente da
República Mário Soares com o grau de oficial da Ordem do Infante
D. Henrique e agraciado, em 2007, com a Medalha de Mérito
Cultural pela Câmara Municipal de Coimbra.
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