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PRÉ-HISTÓRIA DO
SEMINÁRIO DA IMACULADA CONCEIÇÃO
DA FIGUEIRA DA FOZ
SEMINÁRIO MENOR DA DIOCESE DE COIMBRA
COLÉGIO LICEU FIGUEIRENSE
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Fundação |
Em Outubro de 1902, o
Dr. José Luís Mendes Pinheiro, Bacharel
formado pelas Faculdades de Matemática e Filosofia da Universidade
de Coimbra, ex-professor da Universidade e do Liceu central de
Coimbra, abriu, na Figueira da Foz, o chamado Colégio Liceu
Figueirense.
O Dr. Mendes Pinheiro, como era vulgarmente conhecido, era um homem
que não se adaptava com facilidade às coisas feitas, nem a ideias
preconcebidas, como deu provas, mais do que uma vez, na vida.
Pensava por ele mesmo e procurava pôr em prática as suas ideias
amadurecidas por longa reflexão. Era um homem vertical. Não se
dobrava, cerimoniosamente, a sugestões, embora estas fossem,
materialmente, aliciantes. E foi esta verticalidade que outros
alcunharam de «caturrice» que o levou a fundar um colégio na
Figueira da Foz e a experimentar nele métodos «originais» por ele
concebidos e que deram ao Colégio Liceu Figueirense uma fama e
sucesso acima dos seus pares.
Tendo sido professor do Liceu central de Coimbra teve ocasião de
verificar as deficiências do ensino médio, na formação da Juventude
para a sociedade portuguesa. Daqui a concepção de um colégio a que
poderemos chamar original, no método, mobiliário, edifícios
(construção e disposição).
Ao Dr. Mendes Pinheiro não interessava apenas uma formação
intelectual dos alunos do Colégio, mas a formação humana num
verdadeiro e total sentido, criar homens de bem, conscientes,
verticais, numa palavra «homens de espinha». O aplauso de muitas
famílias de Portugal e o grande número de alunos internos
demonstraram que o Dr. Mendes Pinheiro não se enganara. Estava no
caminho certo.Instalação no
«Pinhal»
Em Outubro de 1905, o Colégio Liceu Figueirense instala-se em
edifícios próprios. O Dr. Mendes Pinheiro realiza o seu sonho,
apesar de muitos sacrifícios. O Colégio é uma «cidade de ensino». Há
o edifício residencial, onde alunos e professores internos vivem em
família. O edifício das aulas está à parte, pois, numa cidade as
famílias mandam os filhos às aulas fora das suas residências. Há um
ginásio para exercícios físicos com a finalidade de tornar as
crianças ágeis e fortes; uma casa para trabalhos manuais (cultivar a
habilidade manual); urna escola de equitação para adestrar os
rapazes em exercícios de cavalgar, etc. Havia até. dentro do
Colégio, moeda exclusiva para ensinar os rapazes a administrar o que
era seu.
Estes edifícios foram construídos para o colégio, segundo o
orientação do Dr. Mendes Pinheiro e com a finalidade pedagógica que
ele intentava, foram construídos num local magnífico, denominado
«Pinhal», junto à estrada que da Figueira da Foz conduz à Serra da
Boa Viagem. O local não é apenas grandioso pelas vistas, que dele se
usufruem para qualquer dos lados, mas porque situado à beira-mar é
muito saudável pêlos benefícios do ar marítimo sobre a saúde. Aqui
esteve instalado o Colégio Liceu Figueirense durante cinco anos
progredindo ano após ano.
Na Bélgica
Os acontecimentos que ocorreram em Portugal em Outubro de 1910
(proclamação da República) levaram o Dr. Mendes Pinheiro a
expatriar-se, a fechar o seu colégio na Figueira da Foz e a abri-lo
na Bélgica, com o mesmo nome: Colégio Liceu Figueirense, na
pequenina cidade a sudeste da Bélgica-Huy.
Este facto, levar os alunos e professores para a Bélgica, abrir lá
o Colégio Liceu Figueirense é a maior prova da força de vontade de
um homem que quer realizar o seu ideal de educação como ele a
concebia. Despesas, incómodos, expatriação de alunos e professores
estavam abaixo da sua força de vontade. Não será caso único, mas
revela um esforço que não é vulgar. O Dr. Mendes Pinheiro conservou
sempre um reconhecimento grande para com a Bélgica que o acolheu e
ao Colégio. Ao referir-se à Bélgica escreve ele: «Terra
hospitaleira, país modelar, um dos mais avançados na civilização
moderna».
O Colégio Liceu Figueirense esteve na Bélgica durante três anos. O
rebentar da Grande Guerra de 1914 obrigou o Colégio a regressar a
Portugal.
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Regresso à Figueira da Foz |
Voltando a Portugal, o Colégio Liceu
Figueirense veio ocupar as suas instalações na Quinta do «Pinhal»,
como dissemos, na estrada que da Figueira leva à serra da Boa
Viagem.
Aqui continuou o Dr. Mendes Pinheiro a aplicação do seu
método educativo: Educar em familia. São dele estas palavras: «O
educador deve ser amigo das crianças; deve saber captar a sua
simpatia para que ela lhe manifeste os seus sentimentos e não
isolar-se, impondo-se ao respeito pelo temor da sua autoridade
absoluta e por vezes despótica». A respeito da educação
religiosa o Dr. Mendes Pinheiro dizia: «A criança desde que atinge o
uso da razão tem deveres a cumprir para com Deus que é preciso
ensinar-lhe, guiando-a no cumprimento deles». E em outro lugar,
acrescentava e precisava melhor: «Neste Colégio, corno instituto
católico destinado exclusivamente a educação de alunos que desejam
professar a religião católica, a educação religiosa está pois,
intimamente relacionada com a educação moral».
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Colégio Figueirense — Colégio da
Diocese |
O Dr. Mendes ia sentindo o peso dos anos e as forças a faltarem-lhe
para dirigir o Colégio Liceu Figueirense que «à. custa de muito
trabalho e sacrifícios de toda a ordem» tinha fundado e dirigido.
Ele no-lo diz: «Sentindo-me cansado e vendo a saúde a faltar-me,
preocupava-me cada vez mais o futuro desta obra a que tinha
consagrado a minha vida. Nesta altura (1929) chamou-me a Coimbra Sua
Ex.a Revm.a, o Senhor D. Manuel para me propor a compra do Colégio».
As conversações para a aquisição do Colégio por parte da Diocese
começaram nos princípios de 1929. Dois homens estão frente a frente
e cada um deles o mais enérgico e mais firme.
D. Manuel Luís Coelho
da Silva exige uma escritura de venda embora o usufruto ficasse
reservado para o Dr. Mendes Pinheiro. Este diz entregar, para já, a
direcção do Colégio à Diocese, mas só depois faria testamento dele à
Diocese. Por vezes parece que tudo se desfaz.
É então que se mete de permeio Monsenhor José dos Santos Palrinhas,
ao tempo, Pároco de Figueira da Foz. Este sacerdote, sem alarde,
quase em silêncio, mas com muito tacto, tinha um «geitinho» muito
especial para convencer as pessoas. E conversando ou escrevendo, ora
de cá, ora de lá, apelando para os sentimentos do Dr. Mendes
Pinheiro leva-o a fazer a escritura do Colégio à Diocese. Em 13 de
Abril de 1929 já Mons. Palrinhas escrevia a D. Manuel Luís Coelho da
Silva: «Tudo está em ordem para fazer a escritura». A sisa foi paga
na Figueira e importou em 3 OOO$OO. A escritura de compra
foi feita na Guarda, no Cartório do Dr. Alberto Dinis da Fonseca, no
dia 23 de Abril de 1929. Assim o comunicaram ao venerando Prelado,
D. Manuel Luís Coelho da Silva, o Dr. Alberto Dinis da Fonseca em
carta de 26 de Abril, Mons. António Pereira de Almeida que, como se
depreende do seu cartão de 23.iv. 1929, foi o procurador da Diocese,
e o próprio Dr. Mendes Pinheiro em carta de 25 de Abril de 1929,
dirigida para Bustelo (Penafiel) onde D. Manuel Luís Coelho da Silva
se encontrava. São dele estas palavras: «Estive ontem na Guarda onde
encontrei o sr. Dr. Alberto um pouco melhor, mas ainda bastante
doente. Mesmo na cama redigiu a minuta da escritura que ontem mesmo
ficou assinada a tudo concluído conforme os desejos de V. Ex.a».
Nesta mesma carta o Dr. Mendes Pinheiro lembrava ao Prelado a
necessidade de designar a pessoa que devia tomar a direcção do
Colégio e preparar as coisas para um ano lectivo novo e uma nova
faceta da vida do colégio. Escrevia assim: «Agora convém que V. Ex.a
designe brevemente a pessoa que há-de tomar conta da direcção
efectiva do Colégio, pois é necessário começar com bastante
antecipação a preparação da nova fase da vida do Colégio».
Foi designado director do Colégio Liceu Figueirense (que por
exigências do Ministério teve de mudar o nome para Colégio
Figueirense), Mons. José Duarte Dias de Andrade.
Era ele um sacerdote de muito prestígio na Diocese pela sua
cultura, honestidade e relacionamento. Fora professor de História
Eclesiástica no Seminário, director da Revista Eclesiástica, cónego
capitular, presidente do Cabido, Vigário capitular depois da morte
de D. Manuel Bastos Pina, conferente e pregador de largos recursos,
Protonotário apostólico, deputado ao Parlamento, onde pela sua
palavra fluente e causas que defendeu muito honrou a Igreja e a
Diocese a que pertencia, tornando-se credor do reconhecimento de
todos nós. Mons. Dias de Andrade teve de adquirir nesta data diploma
de ensino particular.
O Colégio, porém, ressentiu-se da mudança de proprietário e de
direcção. Ás famílias retraíram-se, pois, com a nova direcção
haveria certamente novos métodos pedagógicos e ficaram na
expectativa, embora para efeitos de propaganda o nome do Dr. Mendes
Pinheiro continuasse a aparecer abaixo do de Mons. Dias de Andrade.
Faltou insistente e eficaz propaganda junto das famílias que,
tradicionalmente, mandavam os seus filhos para o Colégio Liceu
Figueirense. O número de alunos internos que chegou aos 50 em anos
passados, estava reduzido a 19 em 1935.
Em Julho deste ano (1935) a Diocese, pensou em arrendar o Colégio
aos Irmãos Maristas. Estes vieram ver o Colégio e ficaram bem
impressionados. Em carta a
D. Manuel Luís Coelho da Silva
escreveram: «Ficamos gratamente impressionados de tudo o que vimos e
temos a convicção que o edifício se presta admiravelmente para
Colégio podendo reunir numerosos internos mediante uma boa
organização». Nesta mesma carta pediam ao Prelado as condições de
arrendamento que lhes foram transmitidas mas não aceites pêlos
Maristas. Ern 19 de Julho de 1935 respondiam eles: «Os Irmãos
Maristas tinham muita vontade de tomar a direcção do Colégio
Figueirense, pois para isso fizeram sacrifícios e despesas, mas a
impossibilidade de entrar em acordo obriga a que abandonemos a ideia
de fundar na Figueira da Foz e a procurar outros centros para a sua
actividade».
Entretanto Mons. Dias de Andrade acusava cada vez mais o peso dos
anos e o cansaço de um lutador saído vitorioso de tantos combates.
Era necessário substituí-lo.
Não se tendo realizado o arrendamento do colégio pêlos Irmãos
Maristas a Diocese teve de nomear novo Director; e fê-lo na pessoa
do P. António Antunes da Cruz Gomes, em Outubro de 1935. A Diocese
punha neste sacerdote algumas esperanças de que o Colégio pudesse
ressurgir da decadência a que tinha chegado. O «Correio de Coimbra»,
n.° 687 (31.8.1935), certamente com intuitos de propaganda para o
Colégio Figueirense, fazia daquele sacerdote um rasgado elogio,
pondo em relevo a sua formação intelectual e qualidades pedagógicas.
O Colégio, porém, tinha descido abaixo dos limites de urna possível
recuperação.
Em princípios de 1936 constara na Figueira que o Colégio
Figueirense ia fechar. O Dr. Carlos Loureiro, em seu nome e de
outros, fez então uma proposta de administração do Colégio à Diocese
em que haveria também um representante da Diocese. Esta proposta tem
a data de 7 de Março de 1936. Os autores da proposta desconheciam o
pensamento do Prelado de Coimbra: criar no Colégio Figueirense o
Seminário Menor da Diocese. Por esta razão tal proposta não foi tida
em conta.
Este assunto — a criação no colégio do Seminário Menor da Diocese —
foi certamente exposto ao Dr. Mendes Pinheiro que, em 4 de Maio de
1936, mandou a
D. António Antunes um «Memorandum», historiando a
fundação do Colégio e a sua vida e concordando com «a possibilidade
da instalação dum novo Seminário no antigo Colégio Figueirense».
São dele as seguintes palavras: «...Mas bem ponderadas as cousas,
desde que a Diocese não tem possibilidades de fazer ressurgir o
antigo colégio, por falta de pessoa idónea para o dirigir e deva
criar um novo Seminário, o interesse económico determina que ele
seja aqui instalado desde já. Estas instalações sempre acabarão,
certamente, por terem tal destino, pois, ...... eu desejo
que elas venham a pertencer-lhe (à Diocese) por minha morte. Como já
disse, visto que é impossível a continuação do Colégio como eu o
tinha idealizado, estimarei que ele subsista para o fim especial de
educar rapazes que se destinam ao sacerdócio. Mais valerá, pois, que
o Colégio passe já a esse novo destino...». E numa carta posterior
(23.5.1936) ao Memorandum, o pensamento do Dr. Mendes Pinheiro e a
sua satisfação de que o Colégio passe a Seminário são bem claros.
Escreveu a D. António Antunes: «Creia V. Ex.a Revm.a que verei com
satisfação esta obra ter, ainda nos últimos anos da minha vida, uma
aplicação tão útil para a Igreja Católica, embora não seja
precisamente aquela para que eu a tinha fundado. O homem põe e Deus
dispõe; e se tais foram pois os altos desígnios de Deus permitindo
que eu criasse este colégio e o conservasse através de tantos
obstáculos, considero-me feliz tendo sido humilde instrumento da sua
realização».
Acaba bem o que bem principia. O Dr. Mendes Pinheiro edifica um
Colégio sui generis; segue métodos originais; forma homens que
sempre o hão-de recordar. O Seminário Menor de Coimbra instalado no
antigo Colégio Liceu Figueirense forma carácteres que serão
sacerdotes que louvarão ao Senhor.
A. Brito Cardoso
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