O Seminário da Imaculada Conceição (1936-37 a 1986-87)
 
ASSOCIAÇÃO DOS ANTIGOS ALUNOS DOS
SEMINÁRIOS DA DIOCESE DE COIMBRA
RELATÓRIO DE ACTIVIDADES E UM POUCO DA SUA HISTÓRIA
 
1. Nota introdutória
 

O movimento para a restauração e rejuvenescimento da Associação dos Antigos Alunos dos Seminários da Diocese de Coimbra começou em 1978, há precisamente oito anos e neste mesmo lugar. Seguiu-se uma fase de busca e amadurecimento de ideias, até que a organização encontrou forma estruturada em 1982, com a aprovação e legalização dos estatutos e a redacção e aprovação do Regulamento Interno em 1983.
Os corpos gerentes que agora terminam o seu inandato foram eleitos nesse ano, para um período de três anos.
A natureza e finalidade da nossa Associação imprimem-lhe um carácter peculiar que a distinguem de qualquer outra. No entanto, na ausência de legislação apropriada, teve que sujeitar-se às normas juridicamente instituídas para a constituição da generalidade das sociedades, condição sine qua non para poder usufruir de personalidade jurídica. Por esse motivo, na orgânica da Associação, aparecem os ornamentos pomposos e pretensiosamente burocráticos de Assembleia Geral, da Direcção e do Conselho Fiscal. Valha-nos Deus tanta complicação.
Em trabalhos desta índole, que deve ser de generosidade e disponibilidade, não interessam títulos mas acções. E estas só poderão surgir e tornar-se realidade com o apoio de todos e o sacrifício particular de alguns. Porque alguém tem de sentar-se ao leme, perscrutar os ventos e observar os mares. Como um barco sem arrais, um corpo acéfalo não pode movimentar-se.
Mas daí, também, a pobreza do nosso trabalho: de ser feito de raro em raro, desafiando as dimensões da boa vontade, da capacidade imaginativa e das limitações impostas pelas actividades profissionais.
Nestes pressupostos, há que conduzir o sonho realizando dele quanto for exequível. Mas navegando à vista, por falta de instrumentos de marear apropriados, embora com os olhos fitos na distância.
Exigências burocráticas seriam aqui totalmente impertinentes. O que é preciso é avançar, não deixar parar o movimento, ampliá-lo e enriquecê-lo, e não permitir que ele caia na utopia, essa fácil tentação, por si mesmo estéril e desmobilizadora.
E chegámos ao ponto de esta Direcção apresentar agora apenas este relatório. Fazê-lo anualmente achou-se não fazer sentido nem trazer quaisquer vantagens: pela exiguidade das acções realizadas, seria tão somente alimentar uma ridícula burocracia.
Pareceu, todavia, oportuno, ou mesmo necessário, registar sinteticamente três aspectos da nossa actividade, para esclarecimento dos associados:


— marcar os contornos ou limites do seu ideário;
— proceder ao balanço do que foi possível realizar e, baseados na experiência, oferecer algumas sugestões para a continuação do movimento.


É o que faremos seguidamente.

2. Resenha histórica
 

      2.1 — Criação da Associação: Fase de Lisboa


A ideia da criação da Associação dos Antigos Alunos dos Seminários da Diocese de Coimbra nasceu em Lisboa. Alguns antigos alunos, ali residentes, reunidos para o efeito, decidiram dar corpo a uma associação. Tratava-se de concretizar uma vontade ainda difusa, expressa ocasionalmente, uma ou outra vez, sempre que antigos camaradas se encontravam: à mesa do café, numa paragem de eléctrico, num encontro fortuito, numa fugida para o emprego.

— Por que não encontrarmo-nos mais vezes ?
— Sem dúvida que seria interessante. À luz da distância é bem saboroso recordar velhas marioleiras, episódios pícaros, quantas vezes cómicos e burlescos, da nossa irreverência juvenil.
— Podíamos ir mais longe. Podíamos fundar uma associação, enriquecendo os nossos encontros, dando-lhe maior dimensão humana. — Capacidade não nos falta. Não é fácil encontrar um grupo social com a nossa preparação, dada a educação que recebemos.
— E campo de acção também não. Ainda ontem encontrei X. Tu conhece-lo. As dificuldades que o rapaz está a atravessar!

E a ideia foi ganhando pés, escudada na generosidade e no idealismo que só os homens sabem emprestar às suas decisões.
Combinou-se uma reunião, estudando-se a forma prática de contactar outros colegas. Lá compareceram, entre outros, Amadeu Gomes Bento, António Dinis da Fonseca, Jaime Pereira, Armando Dinis Cosme, António Couto e Silva, João Alves Duarte de Carvalho, Manuel Nunes Gomes Novo, Serafim Fernandes das Neves, Amândio Gomes Naia, João Nunes da Silva, Manuel Fernandes, António Vergueiro, António São Marcos Parada, Américo Gonçalves, Álvaro Antunes Bernardes, José Cotrim, Aníbal da Gama Dias Pacheco, Arménio de Ameida Neves, Manuel Martins de Almeida Santos, Joaquim Domingues, Laurindo Vieira da Silva Rodrigues, Amadeu Pinto da Gama e Armando Augusto Dias.
Almoçou-se, conversou-se, discutiu-se, aventaram-se sugestões.


— Uma associação, sim senhor.


E o baptismo fazia-se ali mesmo: seria a Associação dos Antigos Alunos dos Seminários da Diocese de Coimbra.


Novos encontros, maior número de participantes, acrescido entusiasmo clararam horizontes e carrearam novos materiais para a construção nascente.
Para já, era imprescindível elaborar os estatutos, trabalho de que se encarregou, sobretudo, o Amadeu Bento. Foram aprovados em 12 de Abril de 1959.
A leitura dos estatutos e de outra documentação, que é possível consultar, dá-nos medida da generosa dimensão humana dos seus fundadores: enriquecimento humano dos associados através das reuniões, amparo moral e material aos recém-saidos dos seminários, numa altura em que era difícil começar «cá fora» a vida, explicações gratuitas aos que pretendessem prosseguir estudos, bolsas de estudo, criação de uma associação de amparo aos sacerdotes idosos e doentes (não se falava ainda em Caixas de Previdência)... Muito sonho lindo.
Organizou-se a quotização e vários sacerdotes, dentre os antigos colegas, ofereceram generosa participação. O Vice-Reitor do Seminário de Coimbra e futuro Bispo de Aveiro, D. Manuel de Almeida Trindade, condescendeu em descer a Lisboa para atiçar com a sua presença a pequena chama dum grande ideal.
Trabalhou-se com afinco, com generosa dedicação. A sede provisória, local de trabalho e reuniões, era a casa do Amadeu Bento.
Surgiu depois o declínio. Uma actividade desta natureza, alicerçada apenas na boa vontade, na generosidade e no espírito de colaboração, mesmo partindo duma sólida consciência de bem--servir, está sujeita a vicissitudes. Sobretudo, se for demasiado ambiciosa. E, com efeito, por dispersão de alguns elementos, por exigência profissional de outros, a chama foi esmorecendo...
 

          2.2 — Renascimento da Associação: Fase de Coimbra e Figueira da Foz


Com a satisíação e o apoio de muitos de nós, buscou-se no borralho do Passado a brasa amortecida que acenderia a chama de um lume novo. A oportunidade para o ponto de partida esteve em duas reuniões efectuadas no Seminário de Coimbra no verão de 1974 e no de 1975.
Na qualidade de elemento mais responsabilizado pela direcção anterior, o Amadeu Bento apresentou contas dos fundos parados que, entretanto, haviam ficado à sua guarda. Sanaram-se e ultrapassaram-se divergências naturais. E ficou de pé, embora de forma vaga e para alguns dos participantes frustrante, a certeza de que era preciso retomar o trabalho interrompido. De modo diferente, é certo, que as condições sociais, económicas e culturais do País haviam, entretanto, sofrido alterações, mudando mentalidades e criando nova legislação que favorecia os antigos alunos dos Seminários.
Por iniciativa do João Veríssimo, efectuou-se em Julho de 1977 no Seminário da Figueira da Foz uma reunião de antigos alunos, alargada a todos os quadrantes do País. Com a única restrição de se ignorar a situação e a residência de muitos dos nossos antigos colegas, dado não haver uma lista actualizada.
Decisão unânime foi retomar a caminhada. Talvez em moldes menos ambiciosos. Mas, por isso mesmo, mais realistas e exequíveis. Palavra de ordem foi a realização anual de uma reunião de convívio, seguida de uma sessão de trabalho.
Ponderados os prós e os contras, decidiu-se que seria sempre na primeira quinzena de Setembro. Razões válidas levaram a maioria a optar pela Figueira da Foz, em detrimento de Coimbra.
Na reunião do ano seguinte, 1978, ficou assente que a assembleia se realizasse todos os anos, no 2.° sábado de Setembro. Não havendo datas ideais, concluíu-se ser esta a que trazia menos inconvenientes. Foram mandatados para elaborar os novos estatutos o Higino Rodrigues Valente, o José Domingues Serrado e o João Evangelista Loureiro.
Nas reuniões de 1979 e 1980, cimentavam-se os alicerces da velha-nova associação: instituiu-se uma pequena quota anual de 500$00 e alargava-se a lista de novos associados.
Em 1982, foram apresentados à assembleia os estatutos actualmente vigentes, já normalizados em escritura pública, desde Novembro de 1981. Ficou incumbido de elaborar o Regulamento Interno da associação o Higino Rodrigues Valente, que o sujeitou à aprovação na assembleia do ano seguinte, 1983.
Neste mesmo ano, procedeu-se à eleição, por triénio, dos primeiros corpos gerentes, que ficaram assim constituídos:

Assembleia-Geral:

  • José Domingues Serrado
  • Augusto Neves Marques
  • Álvaro Fernandes Moreira

Direcção:

  • João Evangelista Loureiro
  • Higino Rodrigues Valente
  • João Coutinho Veríssimo

Conselho Fiscal:

  • Fernando Rodrigues
  • António Ramos de Almeida
  • João Alves Duarte de Carvalho
3. Plano e balanço de actividades
   
    3.1
    —A reunião de antigos alunos de 1977, que marcou o renascimento da Associação, fora essencialmente uma sondagem, um tacteamento de pulso. Apareceu um número considerável de cessados, estimado em cerca de uma centena. Para alguns, o reencontro inesquecível de antigos companheiros de caminho que a vida dispersara e se abraçavam depois de longos anos de separação.
Marcara-se um encontro de futebol para as 10 horas, com a «perfidiosa» intenção de testar a resistência «canelar» dos monstros in illo tempore. O lugar, claro, eram os vastos campos de Cristo-Rei e Nossa Senhora de Fátima. Foi uma desolação. Apparuerunt rari superstites et in miseris conditionibus. Oh, miséria do tempo! Que acontecera à legenda das antigas gestas gravada em placas de bronze nos idos da memória?
Ao meio dia houve celebração eucarística, seguida de almoço e confraternização no refeitório do Seminário. Mas surgira um mento novo: em lugar das sotainas, a colorir as conversas e enriquecendo o relacionamento humano dos convivas, viam-se muitas senhoras, jovens e crianças.
À tarde, na reunião de trabalhos, aí sim, a soltura das línguas vespertinas lavou a honra da fraqueza das pernas matinais. Sinal dos tempos ou eco de antigos comícios.
Um pouco nebulosamente, fixaram-se ideias e tomaram-se algumas decisões, que ganhariam contorno mais nítido nas reuniões dos anos subsequentes. Alinhamos algumas:

— Fixava-se na primeira quinzena, e depois no 2.° sábado de Setembro de todos os anos aquela reunião magna, mantendo a mesma ordem de trabalhos;
— Decidia-se desde já (com o entusiasmo a que não era alheio o «falerno» de Cantanhede, de Souzelas, da Anadia e de itras bandas soalheiras, que o pachorrento Horácio não desdenharia), o renascimento da Associação;
— Determinava-se a elaboração dos estatutos, como já foi referido;
— Enquanto se trabalhava para que a Associação assumisse forma legal, competia ao movimento, entretanto iniciado, homenagear condignamente Monsenhor Reitor Tomás Francisco Póvoa, por ocasião das suas bodas-de-ouro sacerdotais, ganhando forma a ideia de encarregar o escultor Afonso Henriques, de Aveiro, de fundir para o efeito um busto de bronze a colocar no jardim de entrada do Seminário da Imaculada Conceição;
— Por proposta surgida na assembleia de 1984, criava-se uma bolsa de estudos no montante de 50 000$00, para ajuda aos estudos de um seminarista;
— Fixava-se em 500$00 a quota anual de cada sócio;
— Decidia-se que todos os antigos alunos eram «ipso facto» associados, independentemente de terem em dia as suas quotas;
— Elegiam-se, por aclamação, sócios honorários Monsenhor Tomás Francisco Póvoa e Amadeu Gomes Bento;
— Acordava-se que a colecta da missa revertesse para o Seminário como expressão do nosso reconhecimento;
— Começava-se a organização de um ficheiro de antigos alunos, com nomes e residências actualizados, tendo em mira a publicação de uma lista completa;
— Retomava-se a velha ideia de encontrar caminho para a Associação poder ajudar na solução dos problemas relacionados com sacerdotes idosos e inválidos;
— Lançava-se a ideia da criação de colónias de férias para filhos de antigos alunos;
— Considerava-se fundamento moral da Associação a entreajuda de todos os associados, nos diversos planos da vida: moral, social, profissional e até material;
— Decidia-se o recomeço da publicação do
Renovamini...

     3.2
    — Os corpos gerentes da Associação, eleitos para o triénio de 1983-1986, têm plena consciência das limitações do seu trabalho, Não ignoram, como é evidente, as dificuldades de uma actividade desta natureza, sujeita a condicionalismos de diversa ordem: as ocupações profissionais de cada elemento, a distância que separa uns dos outros, a dificuldade de conciliar datas para as reuniões de trabalho, a própria essência de voluntariado que enforma o movimento, a um tempo difícil e estimulante, pressupondo generosidade e espírito de sacrifício.
Algum caminho se percorreu, entretanto, e outro mais longo fica ainda por percorrer. Será legítimo, contudo, salientar alguns dados positivos, algumas metas alcançadas:
— O primeiro grande dado positivo foi o arranque do movimento, de que todos os participantes foram obreiros e protagonistas. Destaca-se, por imperativo, de justiça, o trabalho do João Veríssimo.

— Levou-se a cabo a homenagem a Monsenhor Tomás Francisco Póvoa, inaugurando-se o seu busto em 8 de Dezembro de 1982. Falando em nome de todos nós, o Higino Valente soube encontrar com brilhantismo as palavras apropriadas.
— Vêm-se realizando regularmente as assembleias anuais, facto só por si muito enriquecedor. Mau grado a «deserção» de alguns, o movimento vai alargando as suas dimensões.
— Deu-se existência legal à Associação, com a redacção e legalização dos estatutos e do Regulamento Interno.
— Afora a bolsa de estudos instituída pela Associação, surgiram já duas outras oferecidas por associados e mais duas irão aparecer.
— Começou-se a elaboração do ficheiro dos antigos alunos, trabalho naturalmente muito moroso.
— Recomeçou-se a publicação do
Renovamini, sendo o número publicado da total responsabilidade da equipa do Seminário da Figueira da Foz.
— Estreitou-se a amizade entre antigos alunos e suas famílias e reforçou-se os laços de gratidão para com o Seminário.
4. Sugestões
A gerência que ora termina reconhece, com humildade, a pobreza do seu trabalho e pede aos seus continuadores o engenho, a iniciativa e o empenho que permitam levar por diante, e se possível ampliá-lo, o plano atrás esboçado.
Não podemos deixar de lembrar que o Seminário da Imaculada Conceição vai em breve celebrar os 50 anos da sua criação. A Associação deve envidar todos os esforços para se associar à efeméride.
Um nome grato na recordação de todos nós não deve ficar esquecido: a figura patriarcal do Dr. Mendes Pinheiro.
Ao longo destes últimos anos, verificamos que alguma coisa falhava na organização dos nossos encontros. As queixas mais fundamentais advinham das esposas dos antigos alunos, obrigadas a suportar anualmente a mornidão enfastiante de um dia longo e sem atractivos. Outra evidência está na verificação desani-inadora que, anualmente, novas caras aparecem mas outras desaparecem, o que pressupõe uma defeituosa organização da nossa parte e a certeza de que a motivação deixa muito a desejar. Há, pois, que reinventar as nossas reuniões e descobrir processos de as dinamizar e tornar mais atractivas.
A este propósito, adiantaríamos uma proposta: inversão do método seguido até aqui, como se indica:
1 — Começo dos trabalhos às 9,30 horas da manhã;
2 — Ocupação dos familiares dos associados enquanto duram as actividades;
3 — Cerimónias religiosas, almoço e confraternização.
 
Faríamos também uma referência à quotização. Tornando-se ridícula a quota anual de 500$00, propomos que esta passe para o dobro e que o pagamento seja liberalizado, deixando esta ninharia à consciência de cada um.
5. Em tempo

Intencionalmente, guardámos para o fim dois agradecimentos e uma recordação.
Os agradecimentos vão para os Seminários, pelo carinho e inexcedível amabilidade com que nos têm acolhido, e para o nosso Bispo, D. João Alves, pela honra que nos tem dado com a sua presença e, sobretudo, pelo estímulo que ela vem significando para nós.
E uma recordação pungente: o humor inesquecível do Dr. Paulo e a alegria contagiante do João Loureiro, que Deus afastou da nossa presença mas não da nossa saudade.

 

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O livro tem a autoria do Padre João Coutinho Veríssimo

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